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Interior
"Que o português médio conhece mal a sua terra – inclusive aquela que habita e tem por sua em sentido próprio – é um facto que releva de um mais genérico comportamento nacional, o de viver mais a sua existência do que compreendê-la.", Eduardo Lourenço - "O Labirinto da Saudade"
Quem se esquece de onde vem dificilmente saberá para onde vai ou como dizia monsenhor Lourenço Pires, meu conterrâneo: "É de duvidar do carácter daquele que diz mal da sua terra e não a defende". Uma das causas da crise que vivemos é sem dúvida o desapego da civilização em relação às suas origens e o esquecimento a que votámos aquilo que nos foi transmitido pelos nossos avós e antes pelos avós deles.
O problema do Noéme sintetiza-se de uma forma muito simples: pequenos homens poluem um pequeno rio de uma pequena terra. Esquecem-se contudo que as gentes a quem pertence o rio são do "sagrado território da Beira". Esquecem-se que o Beirão é daquela raça de gente que sempre lutou e venceu a adversidade: onde havia barrocos lavrou fundo com sangue e suor e encontrou terra; contrabandeou ("delito mas não pecado", segundo Leal Freire) para pôr o comer à mesa em casa; emigrou, mas na sua terra construiu casa e a ela regressou assim que pôde. E sobretudo não perdeu o carácter, não curvou a espinha e nunca deixou que lhe pusessem a pata em cima. Esquecem-se que o Beirão lutou sempre pelo que é seu, pelo que é de lei.
O rio é pequeno, a terra é pequena mas não são pequenas estas gentes. Pode sê-la a visão de alguns. Não precisam estas gentes de pena ou de lamento ("coitados lá no interior", como ora se diz. O Interior (o que é isso?) não existe. Não existe como entidade administrativa, não existe como entidade cultural, não existe como entidade sociológica. O Interior (que vem de dentro; dentro de quê?) não é nada. É uma simplificação elaborada por algum iluminado da capital que ainda não compreendeu o que é Portugal. E aceitámos...) O que o Beirão precisar lutará por ele, não precisará que lho tragam nem o irá mendigar. E se necessário for levará consigo o estadulho de castanho, companheiro de muitas guerras.
Sábado passado, dia 05 de Agosto, Eduardo Lourenço (o maior pensador português da actualidade) foi homenageado na sua terra, S. Pedro do Rio Seco. Muitos Beirões ilustres (e não só) regressaram à sua terra por um dia; regressaram ao seu berço; regressaram à Sagrada Beira. Por um dia, uma pequena terra de 150 habitantes foi capital da Beira e ao mesmo tempo capital da Cultura Portuguesa.
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