quarta-feira, 9 de outubro de 2013

"Da mais alta janela da minha casa" de Alberto Caeiro

Da mais alta janela da minha casa 
Com um lenço branco digo adeus 
Aos meus versos que partem para a Humanidade. 

E não estou alegre nem triste. 
Esse é o destino dos versos. 
Escrevi-os e devo mostrá-los a todos 
Porque não posso fazer o contrário 
Como a flor não pode esconder a cor, 
Nem o rio esconder que corre, 
Nem a árvore esconder que dá fruto. 

Ei-los que vão já longe como que na diligência 
E eu sem querer sinto pena 
Como uma dor no corpo. 

Quem sabe quem os terá? 
Quem sabe a que mãos irão? 

Flor, colheu-me o meu destino para os olhos. 
Árvore, arrancaram-me os frutos para as bocas. 
Rio, o destino da minha água era não ficar em mim. 
Submeto-me e sinto-me quase alegre, 
Quase alegre como quem se cansa de estar triste. 

Ide, ide de mim! 
Passa a árvore e fica dispersa pela Natureza. 
Murcha a flor e o seu pó dura sempre. 
Corre o rio e entra no mar e a sua água é sempre a que foi sua. 

Passo e fico, como o Universo.


Alberto Caeiro

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