quarta-feira, 1 de abril de 2020


Porque tudo o que se faz tem um fim

Nas palavras de Mia Couto (numa entrevista a um podcast do Expresso), "pobre é quem perdeu a capacidade de se contar a si próprio". Nada restará se deixarmos de contar a nossa história, de voltarmos ao passado e recordarmos. Recordar para projectar o futuro.

Muitas vezes neste espaço publicámos estórias, fizemos homenagens, partilhámos fotografias e vídeos. Porque o Noemi tem passado e temos de ter a capacidade de o contarmos. Não resolve os graves problemas que existem no presente, mas acreditamos, ajuda a resolver o momento.

Mas também foi um espaço de denúncia, de interrogações de diversa espécie, de provocação... deixou muitas vezes a nu as deficiências do edifício burocrático que sustenta a polis e as instituições, locais e nacionais, que deveriam servir-nos. Em diversas ocasiões pusemos em causa a coerência dos discursos quando confrontados com a prática. O problema saiu da clandestinidade, andou nas bocas do mundo mas continua por resolver. Mudou o poder, continuou o crime ambiental. Ficaram questões por responder, algumas delas em gavetas empoeiradas, a maior de todas "Porque continua poluído há tanto tempo?".

"Tenho esperança que este espaço sirva de denúncias, desperte consciências e seja consequente na resolução deste grave problema ambiental que afecta o nosso concelho.", recordo o que escrevemos há quase 11 anos quando iniciámos este blogue. Lamentavelmente, a última parte não foi cumprida. Chega hoje ao fim o blogue "Crónicas do Noéme" sem se cumprir. Nada temos a acrescentar que justifique continuarmos sem que se tornasse um exercício fútil e de hábito.

"O mais triste, o mais órfão deste mundo é aquele que não tem história". Muitas águas passaram pelo nosso rio e outras passarão. Voltaremos a ser felizes naqueles lugares. Não ficará orfão o Noemi.


Post scriptum: Bem-haja a todos os leitores e amigos que ao longos destes anos suportaram este espaço e das mais diversas formas foram dando ânimo à causa.

sábado, 28 de março de 2020

“Um rio te espera”, Eugénio de Andrade

Estás só, e é de noite,

na cidade aberta ao vento leste.

Há muita coisa que não sabes
e é já tarde para perguntares.
Mas tu já tens palavras que te bastem,
as últimas,
pálidas, pesadas, ó abandonado.

Estás só
e ao teu encontro vem
a grande ponte sobre o rio.
Olhas a água onde passam os barcos,
escura, densa, rumorosa
de lírios ou pássaros nocturnos.

Por um momento esqueces
a cidade e o seu comércio de fantasmas,
a multidão atarefada em construir
pequenos ataúdes para o desejo,
a cidade onde cães devoram,
com extrema piedade,
crianças cintilantes
e despidas.

Olhas o rio
como se fora o leito
da tua infância:
lembra-te da madressilva
no muro do quintal,
dos medronhos que colhias
e deitavas fora,
dos amigos a quem mandavas
palavras inocentes
que regressavam a sangrar,
lembras-te da tua mãe
que te esperava
com os olhos molhados de alegria.

Olhas a água, a ponte,
os candeeiros,
e outra vez a água;
a água;
água ou bosque;
sombra pura
nos grandes dias de verão.

Estás só.
Desolado e só.
E é de noite.

quinta-feira, 26 de março de 2020

"Nós escolhemos ir para a Lua nesta década (...) não porque elas são fáceis, mas porque elas são difíceis", John Kennedy (1961)

"Nós escolhemos ir para a Lua! Nós escolhemos ir para a Lua... Nós escolhemos ir para a Lua nesta década e fazer as outras coisas, não porque elas são fáceis, mas porque elas são difíceis; porque esse objectivo servirá para organizar e medir o melhor das nossas energias e habilidades, porque o desafio é um que estamos dispostos a aceitar, um que não estamos dispostos a adiar e um que temos a intenção de vencer, e os outros, também" - este discurso foi proferido por John Kennedy em 1961 anunciando o objectivo de colocar um Homem na Lua.

Em 1969 (comemorámos no ano passado os 50 anos deste marco histórico) viviam-se também dias de medo, incerteza e imprevisibilidade. Em plena Guerra Fria, o dia seguinte estava mais próximo do holocausto nuclear. Tal não aconteceu, graças aos esforços dos líderes políticos da época. Ao mesmo tempo, União Soviética e Estados Unidos da América competiam entre si pelo desenvolvimento de tecnologia que permitisse colocar um homem na Lua em primeiro lugar.

Havia um desígnio e um objectivo claro que trouxe benefícios à Humanidade. Começámos 2020 com a maior ameaça global dos nossos tempos e muitos de nós nunca viveram nada assim. O mais parecido com isto foi-nos mostrado pela Literatura e pelo Cinema e tem-nos sido lembrado à exaustão. "A Peste", "Ensaio sobre a cegueira", "1984", "A morte de Ivan Ilitch" todos estes livros estão por estas alturas nas listas de "leitura para a quarentena". Não temos como saber com certeza as consequências que daqui virão do ponto de vista da saúde, da economia, da política, da saúde, das liberdades... Podemos presumir, imaginar e se quisermos especular. Comparando por exemplo com o que se tornaram as viagens de avião no pós-11 de Setembro podemos intuir que no futuro mas além das preocupações securitárias também as haverá do tipo sanitário.

Se nos faltava um desígnio global temo-lo aqui: povos de todo o Mundo uni-vos! No imediato necessitamos de toda a cooperação científica para conhecermos este vírus e saber como combatê-lo eficazmente. Urge que surjam lideranças políticas e económicas fortes que tomem as medidas que forem necessárias no momento actual e não deixem que o dia seguinte seja apocalíptico. Cada um de nós tem obrigação de, neste preciso momento, se proteger individualmente pois é o melhor contributo que pode dar à comunidade. Depois seremos chamados a construir uma nova sociedade e um novo modo de vida. Com mais ou menos liberdade... veremos.

O dia seguinte vai ser difícil. Muito difícil. Exigirá muito de nós enquanto povo global "mas servirá para organizar e medir o melhor das nossas energias e habilidades, porque o desafio é um que estamos dispostos a aceitar, um que não estamos dispostos a adiar e um que temos a intenção de vencer, e os outros, também".


PS: Recomendo este podcast do Expresso sobre a ida do homem à Lua.

quarta-feira, 25 de março de 2020

Não visitem a Guarda

Ao longo destes anos, repetimos até à exaustão que se visitasse a nossa região. O apelo agora vai em sentido contrário: não venham! Que ninguém ande a passar pelo país. Deixem o apego da terra para outra altura.

Aprendamos com os exemplos de Itália e Espanha, onde se confirma que as deslocações internas conduziram à situação dramática que vemos todos os dias nas notícias. Fica também o apelo para que as autoridades de proximidade façam cumprir esta medida. Fiscalizem e apliquem punições com firmeza.

O ciclo da Natureza não pára

Em tempos de medo, incerteza e crise a Natureza segue o seu rumo.




segunda-feira, 23 de março de 2020

Cuidado com as imitações Casimiro

Quando nos apresentam projectos, estudos ou lançam primeiras pedras em projectos que só existem em PowerPoint lembramo-nos da canção “Cuidado com as imitações Casimiro”, de Sérgio Godinho.

Promessas, quando não sustentadas com dados, escrutínio e informação clara devem merecer dos Cidadãos desconfiança. Aplica-se à despoluição do rio Noéme e a tudo o resto:

“A moral deste conto
vou resumi-la e pronto
cada qual faz o que melhor pensar
Não é preciso ser
Casimiro pra ter
sempre cuidado pra não se deixar levar.”