quarta-feira, 24 de agosto de 2011
Na terra onde rios e lagos só têm monstros
Vou de férias para a terra onde rios e lagos só têm monstros (imaginários ou não). Ao contrário de cá... que são bem reais. Regresso em Setembro.
segunda-feira, 22 de agosto de 2011
"Tenho Medo de Perder a Maravilha"
Tenho medo de perder a maravilha
de teus olhos de estátua e aquele acento
que de noite me imprime em plena face
de teu alento a solitária rosa.
Tenho pena de ser nesta ribeira
tronco sem ramos; e o que mais eu sinto
é não ter a flor, polpa, ou argila
para o gusano do meu sofrimento.
Se és o tesouro meu que oculto tenho
se és minha cruz e minha dor molhada,
se de teu senhorio sou o cão,
não me deixes perder o que ganhei
e as águas decora de teu rio
com as folhas do meu outono esquivo.
de teus olhos de estátua e aquele acento
que de noite me imprime em plena face
de teu alento a solitária rosa.
Tenho pena de ser nesta ribeira
tronco sem ramos; e o que mais eu sinto
é não ter a flor, polpa, ou argila
para o gusano do meu sofrimento.
Se és o tesouro meu que oculto tenho
se és minha cruz e minha dor molhada,
se de teu senhorio sou o cão,
não me deixes perder o que ganhei
e as águas decora de teu rio
com as folhas do meu outono esquivo.
Frederico García Lorca
sábado, 20 de agosto de 2011
Compras, economias, mercados
Há os que defendem uma intervenção total do Estado (administração central, local, empresas públicas e assim-assim) na economia sendo, por exemplo, proprietário de empresas; há por outro lado os que advogam que o Estado não deve interferir com as coisas do Mercado e que este deve existir, livre e auto-regulado (porque ao contrário dos Estados o Mercado não falha!). Outros ainda defendem um Estado eficiente, que define políticas, dá sinais à economia daquilo que pretende, lavra as leis (e garante o seu cumprimento) e uma iniciativa privada que conhece os seus direitos e deveres (e os cumpre) e tem como objectivo principal criar riqueza. E todos ganham com isso.
Resido em Lisboa mas mantenho o hábito de comprar na Guarda, quando aí me desloco: as coisas do dia-a-dia, nas lojas onde já comprava há muitos anos e onde se criaram muitas vezes relações de amizade ou os produtos endógenos, que só se encontram na região e são de grande qualidade (e deviam ser mais publicitados, divulgados, promovidos). Não me poupo a infernizar a vida de amigos trazendo-os e incutindo-lhes as virtudes da Beira. Faço-o porque deve ser dinamizada a vida desta região, deve incentivar-se a economia local, criar emprego, gerar riqueza... da pequena loja de bairro, da multinacional ou das fábricas.
Todas as empresas (da Guarda ou de outro lado) devem cumprir os seus deveres e as suas obrigações legais (e não me refiro só a impostos). Se não o fizerem prejudicam o mercado, que deve ser saudavelmente concorrencial, lesam o Estado e prejudicam as populações. Se o Estado se demite do seu papel, não faz cumprir as leis ou simplesmente não se dá ao respeito, resta que o mercado funcione.
E neste caso, o mercado funcionar significa que os consumidores devem rejeitar os produtos produzidos por empresas que não cumprem. Na Guarda... ou noutro lado qualquer.
E neste caso, o mercado funcionar significa que os consumidores devem rejeitar os produtos produzidos por empresas que não cumprem. Na Guarda... ou noutro lado qualquer.
segunda-feira, 8 de agosto de 2011
Interior
"Que o português médio conhece mal a sua terra – inclusive aquela que habita e tem por sua em sentido próprio – é um facto que releva de um mais genérico comportamento nacional, o de viver mais a sua existência do que compreendê-la.", Eduardo Lourenço - "O Labirinto da Saudade"
Quem se esquece de onde vem dificilmente saberá para onde vai ou como dizia monsenhor Lourenço Pires, meu conterrâneo: "É de duvidar do carácter daquele que diz mal da sua terra e não a defende". Uma das causas da crise que vivemos é sem dúvida o desapego da civilização em relação às suas origens e o esquecimento a que votámos aquilo que nos foi transmitido pelos nossos avós e antes pelos avós deles.
O problema do Noéme sintetiza-se de uma forma muito simples: pequenos homens poluem um pequeno rio de uma pequena terra. Esquecem-se contudo que as gentes a quem pertence o rio são do "sagrado território da Beira". Esquecem-se que o Beirão é daquela raça de gente que sempre lutou e venceu a adversidade: onde havia barrocos lavrou fundo com sangue e suor e encontrou terra; contrabandeou ("delito mas não pecado", segundo Leal Freire) para pôr o comer à mesa em casa; emigrou, mas na sua terra construiu casa e a ela regressou assim que pôde. E sobretudo não perdeu o carácter, não curvou a espinha e nunca deixou que lhe pusessem a pata em cima. Esquecem-se que o Beirão lutou sempre pelo que é seu, pelo que é de lei.
O rio é pequeno, a terra é pequena mas não são pequenas estas gentes. Pode sê-la a visão de alguns. Não precisam estas gentes de pena ou de lamento ("coitados lá no interior", como ora se diz. O Interior (o que é isso?) não existe. Não existe como entidade administrativa, não existe como entidade cultural, não existe como entidade sociológica. O Interior (que vem de dentro; dentro de quê?) não é nada. É uma simplificação elaborada por algum iluminado da capital que ainda não compreendeu o que é Portugal. E aceitámos...) O que o Beirão precisar lutará por ele, não precisará que lho tragam nem o irá mendigar. E se necessário for levará consigo o estadulho de castanho, companheiro de muitas guerras.
Sábado passado, dia 05 de Agosto, Eduardo Lourenço (o maior pensador português da actualidade) foi homenageado na sua terra, S. Pedro do Rio Seco. Muitos Beirões ilustres (e não só) regressaram à sua terra por um dia; regressaram ao seu berço; regressaram à Sagrada Beira. Por um dia, uma pequena terra de 150 habitantes foi capital da Beira e ao mesmo tempo capital da Cultura Portuguesa.
sexta-feira, 5 de agosto de 2011
"Doiro"
Corre, caudal sagrado,
Na dura gratidão dos homens e dos montes!
Vem de longe e vai longe a tua inquietação...
Corre, magoado,
De cachão em cachão,
A refractar olímpicos socalcos
De doçura
Quente.
E deixa na paisagem calcinada
A imagem desenhada
Dum verso de Frescura
Penitente.
Miguel Torga
Na dura gratidão dos homens e dos montes!
Vem de longe e vai longe a tua inquietação...
Corre, magoado,
De cachão em cachão,
A refractar olímpicos socalcos
De doçura
Quente.
E deixa na paisagem calcinada
A imagem desenhada
Dum verso de Frescura
Penitente.
Miguel Torga